Como é trabalhar em um Centro de Tecnologia?
Passamos o dia em Camaçari (BA) e conversamos com profissionais da Ford para entender o que é necessário para seguir carreira no ramo. Confira.

ucas Santos (29) acorda todo dia às 5 da matina. Faz um exercício físico – usualmente 20 minutos de corrida – toma um banho, faz uma vitamina e está pronto para mais um dia de trabalho.
O profissional trabalha como analista de benchmarking no Centro de Tecnologia da Ford. Isso quatro vezes na semana – de sexta-feira, o profissional pode ficar trabalhando de casa. Nos outros dias, vem em conjunto com outros colegas em um carro da empresa para o escritório, em Camaçari (BA).
A sua área, Teardown and Benchmarking – jeito de denominar o setor que desmonta veículos da Ford e da concorrência – realiza a comparação das peças para entender como otimizá-las e trazer o maior custo benefício e performance para o cliente. “Dessa forma, a gente consegue gerar ideias que a engenharia da empresa possa implementar para melhorar as peças, de uma forma integrada com o time da Ford ao redor do mundo”, conta à Você S/A.
Isso mesmo que você leu – o trabalho do engenheiro envolve equipes de inúmeros países (especialmente da América do Norte, local em que a maior parte das peças são fabricadas atualmente).
“Quando avaliamos veículos vendidos nos Estados Unidos ou China, por exemplo, trabalhamos essas ideias para otimizar as peças e torná-las mais competitivas em conjunto com esses engenheiros desses locais. Para entender melhor o mercado de lá”, complementa o profissional.
Justamente por isso, 70% de sua rotina de trabalho envolve reuniões, e-mails, conversas e ligações em inglês. Tudo para discutir esses eventos – nome dado aos momentos em que a equipe de engenheiros escolhe o veículo para desmontar do zero. Quando conversamos, a equipe de Santos estava estudando um veículo exclusivo ao mercado dos Estados Unidos – trabalho que duraria mais alguns meses.
Lucas cantou a bola na conversa com a Você S/A, mas você já deve ter inferido ao ler sua rotina: trabalhar com tecnologia envolve exercer o músculo bilíngue. E muito.
“É fundamental. Uma boa comunicação é a chave para que você consiga apresentar e se destacar para as pessoas lá de fora, que compõem muito do fluxo de trabalho”, explica Santos.
Quem concorda com ele é Fernanda Edens (35). A profissional, que hoje ocupa o cargo de supervisora global de Gerenciamento de Projetos OTA (Over The Air – isso significa que a atualização do software dos veículos rola remotamente), entrou na empresa como engenheira júnior em 2014.
Nesses 10 anos, não demorou muito para que a profissional tivesse contato regular com o inglês. “Quando fui promovida a gerente de projetos, eu tive que participar de reuniões globais todos os dias. Entrei em contato ali com o inglês com sotaque – que foi difícil até para mim, que já tinha feito intercâmbio e estudado a língua lá fora”, conta.
Fernanda conta que, por vir de uma família de médicos, pensou que seguiria pelo caminho das biológicas. Mas foi na engenharia de produção que a profissional se encontrou – especialmente na área de gerenciamento, com direito a muito excel, cálculo, produção e planejamento. O currículo é de peso: além da Ford, Erdens tem passagem pela Braskem e Raízen.
A história de Lucas, hoje prata da casa (segundo o diretor de Desenvolvimento do Produto da Ford aqui na América do Sul, Alex Machado), tem uma jornada menos linear. O profissional entrou na faculdade de engenharia de produção no Senai em 2015, e logo percebeu o leque de possibilidades que o diploma oferecia dentro do mercado de trabalho.

Seu primeiro estágio, em 2018, foi em uma empresa fornecedora da Ford. Foi lá que ele pegou gosto pela indústria automobilística – mas a vida o levou para outros caminhos. Lucas chegou a sair de Salvador para empreender; pela pandemia, abandonou o projeto para atuar na área hospitalar em Sergipe. Em 2021, voltou para Salvador, atuando agora na parte de logística.
Santo dia, uma amiga de Santos compartilhou um recém aberto programa de estágio da Ford. Naquele momento, Lucas trampava como supervisor de almoxarifados de várias obras diferentes em Salvador. “Durante aquele período em que saí da indústria automobilística, passei por três áreas diferentes. Não me identifiquei com nenhuma – por isso mesmo me joguei no estágio da companhia”, diz.
Lucas passou para a área de desenvolvimento de produtos. “Eu saí de supervisor para estagiário, então precisei me adequar para poder passar por esse momento. Mas eu sabia que era temporário – e mudou minha vida, tanto profissional quanto pessoal. Depois que virei pleno na companhia, tudo começou a deslanchar”, diz o profissional, que hoje cursa uma pós-graduação de Ciência de Dados pelo Senai-Cimatec.

O que é preciso
Os profissionais floresceram nesse ambiente competitivo da tecnologia – e afirmam que não há fórmula exata para o sucesso. Contudo, para além do inglês, ambos observam que existem algumas características que foram valorizadas neles e em colegas dentro da empresa.
“Eu enxergo a importância do olhar técnico. Mas não dá para deixar de lado a criatividade”, aconselha Lucas.
Na área em que atua, nem todos são extrovertidos. Os perfis que existem e perseveram na empresa são múltiplos. Mas Lucas defende a boa comunicação – independente da afinidade e da vontade de falar em público, conseguir explicar claramente aquilo que a sua área desenvolve (especialmente conseguir fazer isso em inglês) traz mais visibilidade ao seu trabalho, garante.
Acima de tudo, Lucas defende que não é essencial saber tudo. “O importante é ter esse gosto por veículos. Assim você vai se encontrar rapidamente dentro da área”, explica.
Para Fernanda, ela foi recompensada dentro da empresa pela personalidade proativa, colaborativa e questionadora. Nada do perfil ermitão do setor de softwares – a boa desenvoltura e boa comunicação são essenciais para quem quer ganhar visibilidade na área.
“É importante saber que nada é óbvio. Fazer um bom sumário, tirar suas dúvidas assim que elas aparecem, conversar constantemente com a equipe é a chave do sucesso no gerenciamento de projetos”, explica Fernanda. Que também tem chefe nos Estados Unidos e reuniões o dia todo – acho que não precisamos reiterar a importância do inglês novamente, mas cá ela está.
“Estar aberto a aprender é o principal”, finaliza Lucas. Como, claro, tudo na vida.