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Jogador nº 1: saiba como é trabalhar com teste de games

Parece a carreira dos sonhos. E talvez seja mesmo para muita gente. Mas o trabalho de testador de games demanda uma rotina árdua.

Por Juliana Américo
Atualizado em 15 abr 2021, 16h40 - Publicado em 5 abr 2021, 08h00
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 (Carlos Pedretti/VOCÊ S/A)
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5Não importa se você é da época do Atari ou se está aproveitando o isolamento social para se divertir com um PlayStation 5. Muita gente que gosta de videogame já sonhou em ganhar a vida jogando. O legal é que não se trata de sonho.

O mercado de videogames cresceu 12% no primeiro ano da pandemia; terminando 2020 com um faturamento global de US$ 126,6 bilhões. E o Brasil não fica de fora desse movimento. Somos o quarto principal mercado de games do mundo. São 84 milhões de jogadores brasileiros espalhados entre as plataformas mobile, console e desktop. Estamos atrás só da Índia, da China e dos Estados Unidos, segundo um levantamento da empresa de análise Comscore.

Também passamos muito tempo jogando: em média, cada usuário gasta 9 horas e 56 minutos por mês com games. Não é tanto quanto os americanos, que passam 19 horas e 58 minutos jogando, mas é o suficiente para nos colocar na quinta posição entre os países mais viciados em videogames.

O Brasil tem até um unicórnio do setor para chamar de seu. Em 2019, a Wildlife Studios, desenvolvedora de jogos para dispositivos móveis, como Sniper 3D e Castle Crush, entrou para a seleta lista de startups que valem mais de US$ 1 bilhão. Por essas, não há dúvida: o setor está fervendo por aqui.

“A gente está com uma janela de oportunidade muito boa. Temos um crescimento não só em consumo de games, mas também na produção e na prestação de serviços. Existem estúdios que trabalham só com o consumidor final, mas também há empresas que aplicam os jogos na área de educação, treinamento corporativo e publicidade”, diz Rodrigo Terra, presidente da Abragames (Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Jogos Eletrônicos).

Os desenvolvedores e designers são as profissões mais populares na indústria de jogos. Mas existe um cargo cobiçado pelos amantes de games: o de QA (Quality Assurance, também conhecido como game tester). Sim, estamos falando dos testadores de videogames – profissão que, no mundo dos sonhos pitorescos, só concorre com a de testador de colchões.

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Esse profissional é o responsável pelo controle de qualidade dos jogos digitais. Ele passa por todas as fases do game em busca de erros que podem atrapalhar a experiência do usuário – além de evitar que as falhas virem memes. Alguns bugs ficaram famosos até: no Fifa ou PES, por exemplo, já é normal os jogadores de futebol aparecerem sem um braço ou uma perna, ou a bola ficar grudada na trave.

Por mais que garantam algumas risadas, os erros podem atrapalhar na imagem da desenvolvedora, e uma eventual má jogabilidade, transformar o jogo num fiasco de vendas. O QA, então, tem um papel importante no resultado final do produto. Ele é o primeiro a jogar de fato. E sua avaliação é levada em conta pelos desenhistas e roteiristas na hora de incluir ou excluir algum recurso.

Mais trabalho, menos diversão

Parece fácil passar o dia jogando videogame, certo? Mas não. A rotina pode ser árdua. Quando o protótipo do jogo está pronto, ele vai para a mão do testador, que sai caçando todos os erros possíveis. Isso significa passar pela mesma fase centenas de vezes – o profissional chega a ficar até 40 horas testando a mesma etapa. E quando o game permite jogar com mais de um personagem, como no clássico Street Fighter, o trabalho se multiplica. O QA vai fazer todos os testes com cada um dos avatares.

A ideia é conseguir repetir algum eventual erro várias vezes para provar aos desenvolvedores que, sim, aquilo pode afetar qualquer jogador – alguns são fáceis de identificar, como a perna do personagem desaparecendo; mas outros podem demorar até serem descobertos, como um problema no código-fonte que trava o jogo em situações muito específicas. Cabe ao testador encontrá-las.

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Depois disso, o QA prepara um relatório detalhando todos os erros e as situações em que eles ocorreram, de modo que os desenvolvedores tenham pistas de como corrigir. Aí vem mais uma bateria de testes para garantir que está tudo certo com a segunda versão, e que a correção não criou novos bugs. Adicione ainda uma certa pressão, porque o tempo para teste é limitado; afinal, a produtora tem uma data de lançamento para cumprir.
“Muita gente pensa que o QA vai ganhar dinheiro jogando videogame. E não é isso. A gente recebe para testar um software por horas. Você faz um estudo do jogo, monta um planejamento das etapas do teste e faz a mesma coisa várias vezes até encontrar um problema. Precisa de muita paciência”, afirma o game tester Pedro Rocha.

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(Carlos Pedretti/VOCÊ S/A)

O paulistano, de 23 anos, mergulhou no mundo dos games cedo: aos 3 anos já estava brincando com o controle do videogame. Não foi nenhuma surpresa para a família quando ele começou a estudar modelagem 3D (o desenho digital de objetos em três dimensões) e decidiu cursar Design de Games. Hoje, além de trabalhar como QA freelancer, Pedro está começando o próprio estúdio de produção de games com outros cinco colegas.

O grupo atua junto à Game for Change, um movimento que promove o desenvolvimento social por meio de jogos. Por isso, é comum desenvolverem games educacionais e testarem junto com crianças de escolas públicas. “Para você ser um bom tester, precisa estudar muito o seu público-alvo. Então, se é um jogo infantil, você tem que deduzir tudo que uma criança daquela faixa etária pode tentar. O jogador sempre vai querer explorar o ambiente do game e fazer coisas que geralmente não eram para ele fazer. Por isso, a gente passa horas e horas imaginando e recriando todas as situações possíveis.”

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E o contato com o público pode ser o diferencial entre um game fazer sucesso ou não. Pedro relembra de uma vez que foi testar um jogo com crianças de 4 a 12 anos. Durante a atividade, uma menina de 6 anos falou que eles deveriam colocar legenda no game para pessoas com deficiência auditiva. “A menina pontuou isso assim que olhou para o jogo, enquanto um monte de marmanjo não pensou na acessibilidade durante o desenvolvimento.”

Habilidades

O game tester é um profissional multidisciplinar. Significa que ele precisa entender um pouco de cada etapa de todo o processo de produção de um jogo para conseguir explicar os erros para todas equipes envolvidas. Não existe uma graduação específica, mas é preciso conhecer um pouco de programação, animação, roteiro e tecnologia – por isso, as graduações em TI, Engenharia, Programação e Design de Jogos são as que mais ajudam.

Também é preciso entender sobre os conceitos de testes de software. Existem diferentes tipos de testagens, que levam em conta segurança do sistema e código-fonte, por exemplo. Além disso, alguns processos podem ser automatizados; então é preciso estar atualizado sobre novas tecnologias que permitam agilizar o trabalho. E nada de fugir das aulas de inglês. O idioma é fundamental para lidar como as plataformas de distribuição de jogos e as linguagens de programação.

Algumas empresas até contratam estagiários para a área de testes, mas Igor La Luz, gerente acadêmico nacional da escola de desenvolvimento de jogos Saga, ressalta que as vagas para QA costumam buscar por profissionais de nível sênior. “É um cargo que envolve gestão de projetos, gerenciamento, conhecimento sobre a indústria de entretenimento e do negócio da companhia. Então precisa ser alguém com experiência e que tenha atuado em outras frentes de produção de games.”

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Na parte comportamental, você precisa ser detalhista e organizado, claro. Mas, se não souber se comunicar bem, não adianta, já que a produção de um videogame envolve muitas áreas e os erros podem ser desde programação até de tradução. O QA, no fim das contas, é um ponto focal entre todas as equipes – precisa saber falar com todo mundo. Ou seja: aquele estereótipo do jogador introvertido que gosta de ficar trancado no quarto não funciona.

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(Arte/VOCÊ S/A)
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