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Ela começou a trabalhar aos 16 e hoje é presidente da Microsoft no Brasil

Presidente da Microsoft Brasil, Tânia Cosentino fala sobre os planos da companhia de usar a tecnologia para ajudar o país

Por Juliana Américo
Atualizado em 17 set 2020, 15h10 - Publicado em 31 ago 2020, 09h26
Tânia Cosentino, presidente da Microsoft Brasil (Divulgação/Divulgação)
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Há um ano e meio, a paulistana Tânia Cosentino, de 55 anos, deixou para trás uma história de duas décadas na multinacional francesa Schneider Electric para assumir o cargo de presidente da Microsoft Brasil. Seu desafio é liderar o avanço da inteligência artificial e do machine learning no país — não apenas no mundo corporativo mas também em questões sociais, como saúde e educação.

Em 2017, a executiva foi reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) por seus trabalhos em prol do desenvolvimento sustentável. Além disso, ela é integrante do programa de igualdade de gênero HeForShe, também da ONU. Em entrevista para VOCÊ S/A ela explica quais são suas prioridades e os aprendizados de uma carreira de mais de 35 anos — Tânia começou a trabalhar cedo, aos 16.


Antes de entrar na Microsoft, você ficou quase duas décadas na Schneider Electric. Como foi essa experiência?

No ano 2000 eu assumi a gerência comercial da Schneider Electric. Foi lá que eu desenvolvi minha carreira de líder. Comecei como gerente comercial, três anos depois fui para a diretoria da área e passei um ano na França cuidando da integração de uma aquisição global. Em 2009, assumi como presidente da subsidiá­ria brasileira e, em 2013, passei para o cargo de presidente da América do Sul. E esse foi um momento de muito aprendizado, porque eu fui a primeira mulher a ocupar a presidência brasileira e participei de muitos processos de aquisição e integração. Eu fiquei na Schneider até final de 2018 e depois assumi a Microsoft.

E como foi sair de lá depois de tanto tempo?

Sempre dá um frio na barriga, mesmo porque eu tenho um carinho enorme pela Schneider. Mas a mudança para a Microsoft, na verdade, foi um namoro de quase dois anos, nos quais eu conheci mais a companhia, entendi os valores e o que me motivaria a mudar de empresa. O que me motiva, sempre, é a possibilidade de impactar mais por meio do negócio, e eu queria entender qual é o papel de um gigante da tecnologia na sociedade. Comecei a me aprofundar nos projetos da Microsoft e me apaixonei. Por outro lado, foi uma dor no coração abandonar a Schneider, os meus amigos e o meu time. Mas a equipe da Microsoft me recebeu superbem, e a gente sempre tem que estar aberta para aprender. Poder conhecer uma cultura organizacional nova, um mercado diferente e renovar o network é algo precioso.

Sua atuação é forte nos temas de diversidade e sustentabilidade. Como se aproximou deles?

Em 2009, quando eu assumi a presidência da Schneider, comecei a olhar para o lado e percebi que havia poucas empresas lideradas por mulheres. Foi quando entendi que eu tinha um papel importante de tentar diminuir essa desigualdade de gênero e outras questões voltadas para a diversidade. Ao mesmo tempo, eu me conectei com o tema sustentabilidade porque no negócio de energia há muita emissão de CO2 e precisávamos desenvolver uma economia de baixo carbono. Quando vim para a Microsoft, a empresa já era signatária dos pactos de inclusão da ONU e tinha um compromisso global de redução das emissões de carbono até 2030 e de neutralização das emissões históricas até 2050. Mas descobri a oportunidade de usar as plataformas do negócio para trabalhar as questões de inclusão e sustentabilidade. Conseguimos, por exemplo, ajudar nossos parceiros a diminuir suas pegadas de carbono; auxiliar pessoas com deficiência por meio de ferramentas de acessibilidade; e apoiar projetos de ensino de programação para meninas.

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Você se candidatou para promoções dentro da Schneider Electric. Mas muitas mulheres não fazem isso, por sofrer de síndrome do impostor e achar que não estão prontas. Como você vê essa questão?

Não é porque eu me jogava na posição que eu não tinha medo ou não me achava uma impostora. Mas o que ajuda é o autoconhecimento: saber quais são seus pontos fortes e aqueles em desenvolvimento. Quando você se alavanca em seus pontos positivos, acaba neutralizando aquilo que não é tão bom. Um conselho é procurar por um mentor ou um coach para ajudar nesse autoconhecimento — eu sempre fiz isso para receber feedbacks e conselhos e até mesmo para me incentivar. Mas chegou um momento em que percebi que, se não levantasse a minha voz, eu não seria ouvida nem considerada para as posições de liderança.

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(Arte/VOCÊ S/A)

Como isso aconteceu?

Em 2003, quando o meu chefe foi promovido para a presidência da Schneider Colômbia, eu era gerente comercial e descobri que não era uma opção para assumir como diretora comercial. Isso me deixou indignada. Foi aí que entendi que eu precisava me mexer para a empresa me enxergar. Fiz isso para os cargos de diretora e de presidente. Lógico que, depois, surge o questionamento sobre se vamos dar conta. Mas isso é normal quando estamos assumindo um desafio muito grande. O que eu sempre digo para as mulheres é: falem o que querem dentro da empresa. Se surgir uma vaga do seu interesse, fale para o seu chefe — ele não é obrigado a saber o que você deseja e, às vezes, um colega do sexo masculino consegue a vaga não porque é homem, mas porque foi lá e demonstrou interesse. Além disso, eu acho que nós, mulheres em postos mais altos, precisamos tirar as outras mulheres da invisibilidade. Temos que provocar e despertar a ambição nas nossas meninas e mulheres.

A Microsoft tem um plano de ampliar o negócio de inteligência artificial e nuvem. Como está esse avanço no mercado brasileiro e quais são os desafios?

Antes da covid-19, o desafio era fazer com que as empresas acelerassem seus planos de digitalização. Mas agora as companhias foram lançadas para a transformação digital: as que tinham menor maturidade tecnológica são as que mais sofrem para continuar com o negócio. E, para conseguir suprir a necessidade dos nossos clientes, precisamos ampliar o serviço de data center — tanto que estamos contratando muita gente para trabalhar nessa área. Mas hoje a maior preocupação é que todo mundo está no “modo emergência”. Precisamos começar a entrar no “modo recuperação”. É necessário pensar em como usar a tecnologia para perpetuar o negócio e construir um novo futuro. Muitos falam que a inteligência artificial vai eliminar muitos empregos, mas a verdade é que vai abrir vagas também. O problema é que existem trabalhadores que não vão conseguir se reinventar e é nosso papel pensar na qualificação dessas pessoas.

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De que maneira estão lidando com a pandemia o coronavírus internamente?

Começamos a trabalhar remotamente em 17 de março. Não chegamos a fechar os escritórios, mas a recomendação é ficar em casa. Os funcionários vão para o escritório caso precisem pegar algum equipamento, e as equipes de data center estão trabalhando de dentro da companhia. Mas senti, logo no início, que as pessoas precisavam conversar. Na primeira reunião de equipe que conduzi, todo mundo queria interagir. Então a gente começou a trabalhar muito com as equipes e com os líderes para garantir uma aproximação virtual, nem que fosse com uma happy hour remota. Eu faço regularmente o Café da Manhã com a Presidente, no qual reúno alguns funcionários para conversar — e mantive a agenda virtualmente. Quem participa recebe uma cesta de café da manhã em casa. Também começamos a falar mais sobre saúde mental. Muita gente ainda tem preconceito com esse tema, tem vergonha de falar que está estressada ou sentindo burnout. O nosso plano de saúde já permite o acompanhamento psicológico, mas passamos a oferecer 12 sessões com psicólogo para quem achasse que era necessário. E criamos uma licença remunerada de até 12 semanas para os funcionários que estão com os filhos em casa. Além disso tudo, não interrompemos os nossos projetos, o que traz continuidade ao negócio e tranquilidade aos funcionários.

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(Arte/VOCÊ S/A)

E externamente, qual tem sido o papel da empresa ante a Covid-19?

Na parte da saúde, a Microsoft tem disponibilizado computadores de alta performance para grupos de cientistas que estão em busca de uma cura para a covid-19. Também estamos usando a inteligência artificial para monitorar a oferta e a demanda de equipamentos de proteção individual (EPIs); criamos um aplicativo de emprego para profissionais da área da saúde; desenvolvemos chatbots com informações sobre o coronavírus; e viabilizamos um projeto chamado “Aus Ouvidos”, com psicólogos voluntários que atendem pessoas que estão passando por crises emocionais. Na área educacional, temos alguns programas visando acesso à educação, revisão dos currículos (desde o ensino básico até o superior) e melhor qualificação dos profissionais. Durante a pandemia, ainda lançamos um fundo de investimentos para empreendedoras mulheres, fizemos um hackathon com estudantes para buscar soluções de recuperação econômica pós-coronavírus e lançamos um hub de tecnologia para startups e desenvolvedores.

Quais são os desafios de liderar em momentos de crise?

Olha, você pode imaginar que para uma pessoa com mais de 35 anos de carreira o que não falta são crises no currículo [risos]. Eu entendo que o papel do líder é trazer tranquilidade para a equipe, porque o que não nos falta são coisas ruins, notícias pessimistas e escassez de visão do futuro. Imagine: você está em casa sem saber quando vai voltar a interagir com os amigos, sem saber quando vai poder visitar sua mãe, com medo de você ou um parente ficar doente, de perder o emprego. Há muitas ameaças. Então o líder precisa trazer clareza, comunicar o que está acontecendo com o negócio e tentar criar esse senso de união e propósito para ter toda a companhia alinhada, mesmo a distância. Esteja o mais próximo possível do time e tenha uma escuta ativa para entender o que desmotiva e quais são as necessidades. Pergunte-se o que aprendeu hoje e o que poderia ter feito melhor.

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