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Quais são os direitos trabalhistas de quem adota o anywhere office?

Benefícios da CLT são mantidos. Se mudar de país, é mais fácil o trabalhador manter domicílio fiscal no Brasil e pagar IR aqui.

Por Luiz Guilherme Migliora é sócio da área trabalhista do Veirano Advogados
Atualizado em 26 ago 2021, 11h58 - Publicado em 29 jun 2021, 16h00
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 (Ezra Bailey/Getty Images)
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E o mundo evolui de forma incrível, especialmente quando as pessoas são desafiadas por condições inesperadas e desconhecidas, como é o caso da pandemia da Covid-19 que já se arrasta por mais de um ano sem clara perspectiva de nos deixar tão logo. Embora as tristezas e perdas desse momento sejam avassaladoras, vamos por um momento falar de conquistas que conseguimos obter em tempos de pandemia; falar apenas de coisas boas em um cenário em que coisas ruins se impõem. Vamos lá.

O trabalho fora das instalações das empresas para aqueles que querem fazê-lo é uma conquista. Uma verdadeira revolução. Nunca imaginamos que poderíamos ser eficientes e produtivos fechados nas nossas casas horas a fio todos os dias, em muitos casos sem termos em qualquer momento saído de casa para trabalhar nesses quinze meses.

Aprendemos a usar de forma eficiente a tecnologia disponível e a tirar proveito do que essa modalidade de trabalho tem de bom: mais tempo com a família, menos tempo no trânsito e nas filas de elevadores, mais tempo para se exercitar ou para aprender a cozinhar, ou para ler um bom livro e menos gastos com alimentação em restaurantes e vestimentas e, por fim, mais flexibilidade de horário para trabalhar. Claro que sentimos falta das pessoas, mas não podemos deixar de reconhecer que conquistamos uma nova forma de trabalhar, fruto da necessidade que se impôs.

Pois bem, dominado o trabalho fora da empresa, por que ele deve ser limitado à nossa casa, ao nosso estado, ao nosso país? Vimos locais de veraneio na serra e nas praias virarem residência permanente daqueles que puderam se isolar nesses locais mais agradáveis, bastando para isso uma boa internet. Ótimo. Então, por que não podemos expandir os horizontes? Por que não podemos trabalhar e morar por alguns meses ou anos em outro país? Acompanhar os nossos parceiros naquele projeto antigo de mestrado ou doutorado no exterior sem ter que abandonar o emprego? Se posso trabalhar em casa, por que não posso mudar a minha casa para o país da minha preferência, agregando um novo desafio, o fuso horário, mas que pode ser também superado?

Claro que isso é possível e aposto que será cada vez mais comum. Teletrabalhadores estão escolhendo onde morar. Na praia, na montanha, em outro estado ou mesmo em outro país. Temos certeza que operacionalmente isso funciona. Mas como fica a burocracia? O cumprimento de leis para garantir o cada vez mais popular compliance?

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Começando pelas regras trabalhistas, as respostas parecem intuitivas e podem ser achadas na consulta às leis existentes. Se um empregado que trabalhava antes da pandemia em São Paulo acerta com seu patrão que vai se mudar para os Estados Unidos e ficar um ano em Nova York, de onde continuará fazendo exatamente o que fez desde o início da pandemia, ou seja, trabalhando remotamente, o que acontece com seu contrato de trabalho? Rigorosamente nada. Ele continua em pleno vigor, com o mesmo empregador, mas com uma decisão de que ele será cumprido remotamente a partir de outro país. Idealmente isso deve ser registrado em um adendo ao contrato, mas não é necessário para a sua validade.

Quais leis regulam esse contrato se a regra geral e antiga (Código de Bustamante) é a de que a regra do local da prestação do trabalho regula as relações trabalhistas? Basta buscar o que diz a Lei Mendes Junior (Lei 7074/82), vinda lá dos anos 80 para regular o trabalho do empregado brasileiro enviado para trabalhar no exterior. Claro que a situação não é a mesma. Essa lei foi criada para regular as atividades de empregados da Mendes Junior no Iraque, construindo oleodutos ou algo do gênero. Mas a lei tem como princípio básico a aplicação a esses empregados da lei brasileira quando mais favorável do que a lei do local de trabalho no conjunto ou em relação a cada matéria.

Portanto, a lei brasileira, a velha e boa CLT, continuará a regular esse contrato. Como empregado em teletrabalho, ele ou ela não terá o direito a controle de jornada ou pagamento de horas extras. Mas terá direito a FGTS, INSS, 13º salário, férias com 1/3 etc. E terá aplicados ao seu contrato as regras da CLT que regula especificamente o teletrabalho. Portanto, nada muda. Se houver no novo país de residência regra mais benéfica a respeito de determinado elemento do contrato de trabalho, há como se defender com base na Lei Mendes Junior a sua aplicação, mas a experiência mostra que essa é uma circunstância rara.

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E como ficam as regras decorrentes de acordo ou convenção coletivas? Ótima pergunta, para a qual não há resposta pronta, mas pode ser facilmente construída. Se o empregado trabalha para a mesma empresa, mas apenas agora a partir de Nova York no nosso exemplo, ele continua sendo um empregado daquela mesma categoria trabalhando para o mesmo empregador. Portanto, nada mais natural e saudável do que se aplicar a ele ou ela as regras dos acordos ou convenções coletivos aplicáveis aos demais empregados dessa empresa, considerando sua sede como seu local de trabalho para efeitos de definição da norma coletiva aplicável.

Portanto, do ponto de vista da legislação trabalhista, o trabalho no regime do anywhere office, mesmo que realizado em outro país, pode ser implementado sem maiores desafios do ponto de vista do empregador e de compliance com a legislação trabalhista.

E as obrigações tributárias? Antes de mais nada, registre-se que com a permanência do contrato de trabalho em vigor, os recolhimentos de FGTS e INSS devem, por óbvio, continuar a ser realizados normalmente. Quanto ao imposto de renda, em condições normais, presume-se que o empregado trabalhando remotamente de um país estrangeiro continuará a receber sua remuneração de fonte pagadora brasileira e não apresentará comunicação e declaração de saída definitiva, permanecendo como residente fiscal no Brasil. Neste cenário, o empregador brasileiro que procederá a retenção de imposto de renda na fonte e o empregado continuará obrigado a realizar a declaração anual de ajuste. Nada muda também nesse particular.

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Se houver interesse do empregador em transferir o empregado para o exterior, passando a pagar sua remuneração, por exemplo, através de empresa coligada no país de onde os serviços são prestados, e o empregado encerrar a sua residência fiscal no Brasil, é possível que o empregado deixe de estar sujeito ao pagamento de imposto de renda no Brasil. Essa opção, contudo, traz algumas complicações para o compliance de direitos trabalhistas, pois a empresa brasileira deverá manter o pagamento de INSS e FGTS localmente sobre uma remuneração paga por outra empresa no exterior, o que requer a utilização de uma folha de pagamento espelho (shadow payroll) na qual não há o pagamento da remuneração, mas há o recolhimento de FGTS e INSS. A solução de manter pagamentos realizados localmente parece mais simples.

Enfim, hoje podemos vislumbrar formas diversas de prestação de serviços para aqueles que podem trabalhar fora das sedes de seus empregadores, inaugurando uma evolução ao conceito de home office que pode ser chamado de anywhere office, desafiando os limites da mobilidade de forma nunca antes vista e proporcionando adicionais ganhos de qualidade de vida, nível de satisfação e diversidade nas empresas.

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