Luiz Barsi e o fabuloso dividend yield de 426% em 12 meses
Tem coisas que só um bom papel guardado com carinho durante 50 anos fazem por você.
Warren Buffett mora em um condomínio relativamente simples em sua cidade natal, Omaha, Nebraska, no pouco badalado meio-oeste americano e bem longe de Wall Street. Luiz Barsi vive no Tatuapé, um bairro de classe média da zona leste de São Paulo.
Buffett passa todas as manhãs no Drive Thru do McDonald’s. Paga US$ 2,95 por um hambúrguer de salsicha com ovo e segue para o escritório.
Barsi vai de metrô. Pega a linha vermelha lá do Tatuapé até o Anhangabaú, no centro velho de São Paulo, longe dos prédios espelhados da Faria Lima.
Buffett, com seus US$ 101 bilhões, é a oitava pessoa mais rica do mundo. 99% de sua fortuna está na forma de ações de sua própria empresa, a Berkshire Hathaway – uma companhia cujo principal negócio é deter muitas ações de outras companhias e, dessa forma, ter algum controle sobre elas.
A Berkshire é a segunda maior acionista da Apple – possui 5% das ações, atrás apenas do Vanguard Group, um fundo de previdência privada, que tem 7%. Ela também é dona de partes consideráveis da Coca-Cola, do Bank of America, da Kraft Heinz.
Isso faz de Buffett uma versão humana do Tio Patinhas: um sujeito com tentáculos em vários ramos da economia. Warren, inclusive, só não é mais quaquilionário porque não quer. Ele começou a doar sua fortuna em 2006, transferindo ações da Berkshire que tinha em seu nome para diversas ONGs ligadas à Fundação Gates. Nesses 15 anos, se desfez quietinho de 50% de suas ações – e pretende chegar aos 100%.
Barsi não tem uma fortuna absurda em termos globais, mas possui o bastante para ostentar o título de maior investidor pessoa física do país, com R$ 2 bilhões em ações.
E sua semelhança com Buffett não fica só na manutenção dos hábitos frugais. Está na estratégia de investimento. Ele sempre usou o sistema de Buffett para compor sua carteira: comprar papéis de grandes pagadoras de dividendos – empresas sólidas e com tradição de distribuir seus lucros de forma generosa entre os acionistas.
Barsi, como Buffett, é um buy and holder radical. Não compra ações com o objetivo de vender um dia a um preço maior. Compra para ter para sempre, e transformar o fluxo de dividendos numa previdência privada.
Uma previdência privada com poderes mágicos. Barsi diz que tem até hoje ações do Banco do Brasil que comprou em 1972 pelo equivalente a R$ 0,60 de hoje (“equivalente” porque a moeda brasileira era outra há meio século, claro).
Bom, se Barsi fez os cálculos de equivalência direitinho (e tudo indica que sim, já que de contabilidade o tatuapense sabe tudo), temos o seguinte. Em 2020, o BB pagou R$ 3,16 em dividendos por ação. Considerando que os papéis do banco fecharam o último pregão do ano passado valendo R$ 38,8, tivemos aí um dividend yield (uma renda em dividendos) de 8%. Nada má para um ano em que a renda fixa estava rendendo magros 2%.
Só tem um detalhe. Barsi não pagou R$ 38,8 por suas ações. Parte delas, como ele disse, foi adquirida pelo equivalente a R$ 0,60. Se Barsi tivesse entrado em coma em 1972 e acordado hoje, veria que essas ações renderam 426%, só em 2020.
Nenhuma renda fixa do planeta faz isso por você. Por essas, Barsi gosta de chamar a renda fixa de “perda fixa” – um exagero, claro, pois quem não é milionário precisa manter uma reserva de emergência gorda, de preferência equivalente a um ano de salário, guardada em investimentos de baixíssimo risco, e ações não fazem nem jamais farão parte desse clube. Mas ok. Nem por isso o trocadilho deixa de ter valor.
Nem o trocadilho, nem a lição. O melhor investidor do Brasil e o maior investidor do mundo fizeram suas fortunas surfando na mágica dos dividendos, de forma paciente, disciplinada, ao longo de décadas. Se você está começando no mercado de ações, fica a dica.
Este texto, além de uma coluna do Guia dos Dividendos, é também a carta ao leitor da Você S/A de Julho