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Como colocar em ação as metas de longo prazo

Planos para o futuro distante podem ser um terreno fértil para a procrastinação. Este trecho do livro "O Mesmo de Sempre" explica como colocá-los em prática

Por Camila Barros
21 fev 2024, 09h22
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 (CSA Images/Getty Images)
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Jeff Bezos conta que as pessoas costumam lhe perguntar sobre o que pode mudar no futuro. Ele considera este questionamento intrigante, mas nem de longe o mais importante. Melhor para ele seria perguntar sobre o que não vai mudar lá na frente.

“Você consegue montar uma estratégia de negócios ao redor das coisas que são estáveis ao longo do tempo”, diz. Seja amanhã ou daqui 10 anos, consumidores da Amazon continuarão buscando por preços baixos e entregas rápidas – mesmo que a procura por um produto dê lugar a outro.

No mercado financeiro, Warren Buffett também é discípulo da crença de que os fatos concretos merecem mais atenção do que as especulações sobre o futuro. É dele a frase: “Projeções [econômicas] podem dizer muito sobre quem faz as previsões, mas não dizem nada sobre o futuro”.

À frente da Berkshire Hathaway desde 1965, Buffett escolhe seus investimentos como manda a filosofia do value investing: empresas maduras, boas pagadoras de dividendos, que fazem parte de setores perenes da economia. Companhias que, na prática, conseguem garantir retornos independentemente do cenário econômico.

Morgan Housel propõe que as pessoas adotem este modo de pensar em todas as esferas da vida. Segundo ele, precisamos jogar um olhar especial sobre as coisas que continuarão iguais lá na frente. Desta maneira, conseguimos tomar decisões a partir daquilo que já conhecemos – uma dose de segurança diante de um futuro, por definição, incerto.

Housel é autor do livro A Psicologia Financeira, considerado uma referência no campo das finanças pessoais. Em sua nova obra, O Mesmo de Sempre, ele reúne reflexões sobre as características humanas que considera universais. E oferece conselhos sobre quais seriam os passos imprescindíveis para alcançar certo nível de realização pessoal: controlar as expectativas, combater o perfeccionismo, não desistir de primeira, estar aberto à inovação.

No trecho a seguir, ele reflete sobre a natureza dos planos de longo prazo – terrenos férteis para a procrastinação.

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(Arte/VOCÊ S/A)

Página 190 – Horizontes de tempo

Dizer “Penso nisso a longo prazo” é mais ou menos como parar na base do monte Everest, apontar para o cume e afirmar: “É para lá que eu vou”. Legal. Agora vem o teste.

(…)

Pensar a longo prazo é mais uma dessas coisas em que acreditamos, mas que dificilmente conseguimos pôr em prática. 

O longo prazo é mais difícil do que a maioria imagina, por isso é mais lucrativo do que muitos presumem.

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Tudo o que vale a pena tem um custo, e esse custo nem sempre é óbvio. O verdadeiro preço do longo prazo — as habilidades exigidas, a mentalidade necessária — é fácil de minimizar e com frequência resumido em frases do tipo “Seja mais paciente”, como se isso explicasse por que tanta gente não consegue sê-lo.

Para que o longo prazo não fique só na teoria, precisamos compreender alguns pontos.

O longo prazo é apenas uma coleção de curtos prazos com que temos de lidar.

Afirmar que temos um horizonte de tempo não nos isenta de todos os absurdos que acontecem nos dez anos seguintes. Todo mundo tem que passar por recessões, mercados em baixa, colapsos econômicos, surpresas e memes.                  

Assim, em vez de presumir que alguém que pensa a longo prazo não precisa lidar com absurdos de curto prazo, pergunte-se: “Como posso sobreviver a um incessante desfile de asneiras?”.

O pensamento de longo prazo às vezes é uma muleta emocional ilusória que as pessoas presumem que as ajudará a contornar o doloroso e imprevisível curto prazo. Mas nunca ajuda. Pode acontecer o contrário: quanto maior seu horizonte de tempo, mais calamidades e desastres entrarão em seu caminho. Como disse o jogador de beisebol Dan Quisenberry, “o futuro é parecido com o presente, só que mais longo”.

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Lidar com essa realidade exige um certo tipo de alinhamento que facilmente deixamos de perceber.

A crença no longo prazo não é suficiente. Parceiros, colegas de trabalho, cônjuges e amigos precisam embarcar na sua visão.

Um gestor de um fundo de investimento que perde 40% pode dizer a seus investidores: “Tudo bem, a gente está nessa pelo longo prazo”, e acreditar no que diz. Mas os investidores talvez não. Eles podem abandonar o barco. E a firma pode naufragar. E depois, mesmo que no fim se revele que o gestor estava com a razão, não faz mais diferença: não há ninguém por perto para desfrutar disso.              

A mesma coisa acontece com um casal quando um dos lados corajosamente persevera e o outro não. Ou quando você tem uma grande ideia que levará tempo para ser comprovada, mas seu chefe e seus colegas de trabalho não parecem ter tanta paciência.

Esses não são cenários inusitados. São alguns dos cenários mais comuns na vida, e em grande parte derivam do abismo entre nossas convicções e nossa capacidade de convencer os outros.

O pensamento de longo prazo às vezes é uma muleta emocional ilusória.

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As pessoas caçoam de quanto pensamento de curto prazo existe na indústria financeira, e com razão. Mas, ao mesmo tempo, acho esse tipo de pensamento bastante compreensível: o motivo para tantos profissionais das finanças privilegiarem o curto prazo é porque essa é a única maneira de conduzir um negócio viável quando os clientes fogem ao primeiro sinal de problema.

Mas o motivo para os clientes reagirem frequentemente desse jeito é o fato de os gestores fazerem um péssimo trabalho em explicar como os investimentos funcionam, qual é a estratégia que estão adotando, o que as pessoas enquanto investidores devem esperar e como lidar com o inevitável caráter volátil e cíclico dos negócios. 

Uma coisa é provar que você estava certo no final. Mas podemos estar com a razão e convencer os demais? Isso é completamente diferente, e fácil de subestimar.    

Paciência é muitas vezes teimosia disfarçada.

As coisas mudam, de forma que mudar de ideia é não apenas útil, como também fundamental.  

Mas mudar de ideia não é simples: autoiludir-se para acreditar em algo falso é muito mais fácil do que admitir um erro.   

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O pensamento de longo prazo pode servir como muleta para alguém que está errado e se recusa a mudar de ideia. O sujeito diz “Ainda é cedo” ou “Os outros são loucos” quando não consegue abrir mão de algo que costumava ser verdade, mas que o mundo já deixou para trás.

Para pensar direito a longo prazo, é preciso saber diferenciar quando estamos sendo pacientes de quando estamos sendo apenas teimosos. Não é fácil. A única solução é ter ciência das raras coisas em sua área que nunca vão mudar e separar tudo o mais num compartimento em constante necessidade de atualização e adaptação. As (pouquíssimas) coisas que nunca mudam são as candidatas ao pensamento de longo prazo.  

Tudo o mais vem com data de validade. O longo prazo tem menos a ver com horizontes de tempo do que com flexibilidade.

Imagine que estamos em 2010 e você diz: “Meu horizonte de tempo é de dez anos” — sua data planejada é 2020. E então o mundo desmorona. Se você fosse um negócio ou um investidor, seria um terrível momento para presumir que a vida estava pronta a lhe dar sua tão pacientemente aguardada recompensa.    

Um horizonte de tempo longo com um prazo final rigidamente definido pode ser tão dependente do acaso quanto um horizonte de tempo curto.

A flexibilidade é muito superior.   

O tempo é a magia da composição, e sua importância não pode ser minimizada. Mas nossas chances de sucesso são bem mais favoráveis quando combinamos um horizonte de tempo longo a um prazo final flexível — ou a um horizonte de tempo indeterminado.

“O objetivo da margem de segurança é tornar a previsão desnecessária”, afirmou Benjamin Graham. Quanto maior nossa flexibilidade, menor nossa necessidade de saber o que acontecerá a seguir.

E não nos esqueçamos das palavras de John Maynard Keynes: “A longo prazo, estaremos todos mortos”.

Mais um detalhe sobre o pensamento de longo prazo é como ele influencia a informação que consumimos. Sempre que leio algo, pergunto-me: será que daqui a um ano (ou dez, ou oitenta) vou me importar com isso?    

É preciso saber diferenciar quando estamos sendo pacientes de quando estamos sendo apenas teimosos.

 

Se a resposta na maior parte das vezes for não, sem problema. Mas talvez seja de maior proveito ir atrás de informações com um caráter mais duradouro. Há dois tipos de informação: as permanentes e as com data de validade.    

A informação permanente diz: “Como as pessoas se comportam quando se deparam com um risco que não imaginaram?”. A informação com data de validade diz: “De quanto foi o lucro da Microsoft no segundo trimestre de 2005?”.   

O conhecimento com data de validade recebe mais atenção do que deveria por dois motivos.   

Um: ele existe à farta, tentando ansiosamente manter ocupado nosso breve limiar de atenção.    

Dois: estamos sempre à sua procura, tentando ansiosamente extrair percepções dele antes que perca a relevância.  

É mais difícil notarmos a informação permanente porque ela está enterrada nos livros, em vez de exposta nas manchetes. Mas seus benefícios são imensos. Não só porque a informação permanente nunca perde a validade, permitindo que a acumulemos; mas também porque ela compõe no decorrer do tempo, alavancando o que já aprendemos.

A informação com data de validade nos dirá o que aconteceu; a informação permanente nos diz por que tal coisa aconteceu e a probabilidade de que volte a acontecer. Esse “porquê” às vezes é transferível para coisas que sabemos sobre outros assuntos e interage com eles, e é aí que entra a composição.   

Leio jornais e livros diariamente. Não consigo lembrar de coisa nenhuma que tenha lido nos jornais em, digamos, 2011. Mas posso lhe contar em detalhes alguns dos ótimos livros que li em 2011 e sobre como mudaram minha forma de pensar. Eles ficarão na minha memória para sempre. Continuarei a ler os jornais. Mas a leitura de livros provavelmente me ajudará a desenvolver filtros e estruturas para interpretar melhor as notícias.

A questão, portanto, não é que deveríamos ler menos notícias e mais livros, e sim que ler bons livros nos ajuda a perceber quais são as notícias realmente dignas de nossa atenção.

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(Arte/VOCÊ S/A)
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