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Entenda a diferença entre GGBR4 e GOAU4 – e por que investir em Gerdau

O setor de aço enfrenta uma inundação de produto chinês enquanto os juros altos limitam investimentos de longo prazo. Ainda assim, o mercado está otimista com a Gerdau. Veja por quê.

Por Tássia Kastner
Atualizado em 26 abr 2024, 14h23 - Publicado em 11 out 2023, 05h00
Vista aérea da fábrica da Gerdau
Usina de Ouro Branco, em Minas Gerais: maior fábrica da Gerdau no mundo. (Divulgação/VOCÊ S/A)
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Holding é uma empresa de investimentos – e o mais comum é que ela tenha participação em vários outros negócios. A Itaúsa é a holding ligada ao Itaú, mas também tem ações da Alpargatas, da Dexco, CCR…Há outras razões para esse tipo de empresa existir: veja o caso da Bradespar, criada pelos controladores do Bradesco exclusivamente para organizar o investimento deles na Vale após a privatização.

Já a Gerdau que conhecemos não tem uma holding, mas duas. A primeira é a Gerdau S/A, negociada na bolsa sob os tickers GGBR4 e GGBR3 e que tem sob o seu guarda-chuva as siderúrgicas da companhia. Acima dela existe uma segunda holding, a Metalúrgica Gerdau (GOAU4 e GOAU3), que detém 33,5% do capital da primeira holding.

As duas empresas são comandadas pelos mesmos CEO, CFO e diretores – e têm um conselho de administração compartilhado. Na prática, elas são a mesma companhia, mas com despesas “dobradas”, um dos motivos que levam a ações de holding serem negociadas com “desconto” em relação ao papel principal da companhia. A Gerdau “pura” é um negócio com valor de mercado de R$ 41 bilhões e a ação GGBR4 tem peso de 1,408% no Ibovespa. Já a metalúrgica vale R$ 11,4 bilhões e responde por 0,38% do índice. 

De qualquer maneira, acionistas de GGBR4 ou GOAU4 investem no mesmo negócio com o mesmo objetivo: levar um naco dos lucros da centenária siderúrgica brasileira. E os últimos anos foram estupendos para isso.

A Gerdau S/A teve receita líquida de R$ 43,8 bilhões em 2020, R$ 78 bi em 2021 e R$ 82 bilhões em 2022. O endividamento líquido da companhia foi reduzido para a faixa de R$ 7 bilhões – e a alavancagem é de 0,30 vezes, o que significa que ela precisa de 30% do lucro operacional do ano para pagar suas dívidas. Trata-se de um percentual mais do que confortável, de acordo com analistas.

Os resultados crescentes fizeram com que a Gerdau pudesse ser generosa no pagamento de dividendos. De acordo com seu estatuto, a empresa se compromete a distribuir 30% do lucro líquido anual aos acionistas. Ela pagou mais, e isso nas duas holdings.

Em 2021, a GOAU4 distribuiu 53,9% dos resultados. Um ano depois, o payout da GGBR4 chegou a 58%, o que alçou a companhia temporariamente ao topo do Idiv, o índice da bolsa brasileira de boas pagadoras de proventos. Os resultados sólidos fizeram a GGBR4 cavar espaço nas carteiras recomendadas de bancos e corretoras. 

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Pausa: daqui para frente, falaremos apenas da Gerdau S/A e da ação GGBR4, que é o papel acompanhado mais intensamente pelos analistas.  

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Numa janela de dois anos, entre 2021 e 2023, as ações GGBR4 subiram 20%. Só que desde o pico de R$ 35, alcançado em novembro de 2021, o papel recua 32%. Só neste ano, a queda é de 12,5%.

Acontece o seguinte: os dividendos do primeiro semestre deste ano equivalem a um payout de 38%, acima do mínimo, mas menor que o recorde dos anos anteriores. E com um inconveniente: o lucro da empresa encolheu. 

Em 2021, a companhia lucrou R$ 11,5 bilhões e pagou dividendos de R$ 5,35 bi. Em 2022, foram R$ 10,6 bi de lucro e R$ 6,01 bi em dividendos. Nestes primeiros seis meses, o lucro foi de R$ 4,87 bilhões, queda de 37,4% em comparação com o primeiro semestre de 2022, e os dividendos somaram R$ 1,64 bilhão. Para bater a bolada do ano passado, a companhia precisaria distribuir mais R$ 4,37 bilhões até o fim do ano, 166% a mais que na primeira metade de 2023. Esse não é um cenário provável no curto prazo.

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O pós-pandemia e a moderação

É que olhando para a bonança passada fica fácil esquecer que a Gerdau dos dividendos gordos é um fenômeno recente. Na última década, a companhia registrou lucro anual na faixa de R$ 1 bilhão, isso quando o resultado foi positivo. Nos anos 2010, houve uma sequência de três anos de prejuízo, entre 2015 e 2017, o período da recessão brasileira. 

Mas foi justamente nessa janela de resultados fracos que a companhia promoveu uma transformação no seu negócio. A siderúrgica é uma operação de 122 anos, que surgiu no Rio Grande do Sul a partir de uma unidade de produção de pregos. Ao longo do século 20, consolidou-se como a maior produtora de aços longos do país.

O exemplo enciclopédico de aços longos são os vergalhões usados na construção civil. Trata-se de uma commodity: para quem constrói um prédio, não faz muita diferença se o aço veio da Gerdau, da CSN ou da ArcelorMittal. E aí os preços oscilam mais ao sabor da demanda. Quando a economia desacelera, é preciso cobrar menos para manter as vendas. Aí as margens da empresa diminuem.

De 2012 em diante, a companhia decidiu investir em outros tipos de aços, de maior valor agregado. Naquele ano, 100% do que a Gerdau produzia no Brasil eram aços longos. Hoje, 35% são aços planos, material usado na produção de veículos, eletrodomésticos, navios… e que têm mais valor agregado.

“É uma linha que não existia e hoje é uma parte super substancial no nosso nível de rentabilidade”, afirma Rafael Japur, CFO da Gerdau.

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O Brasil responde por 37,8% da receita, seguido pela operação da América do Norte (35,6%). O negócio tem ainda as unidades de Aços Especiais (18%) e América do Sul (8,6%).

Ainda que haja um equilíbrio na geração de receitas entre Brasil e América do Norte, a operação do outro hemisfério contribui mais para o lucro da companhia. A unidade dos EUA e Canadá gera 52% do Ebitda da Gerdau, enquanto o Brasil entrega apenas 22%. E o segredo está justamente no tipo de aço produzido em cada região. Isso porque, por lá, a companhia decidiu vender quase toda a sua atividade no segmento de aços longos para se concentrar em negócios mais rentáveis.

É essa sofisticação que ajuda na preservação de margens, mas não resolve o problema completamente quando a demanda por aço diminui.

O período pós-pandemia foi marcado pelos juros insanamente baixos no mundo todo, o que favorece investimentos em infraestrutura e em bens duráveis. Isso ajudou a bombar a demanda pelos produtos da Gerdau.

Esse cenário agora pertence ao passado. No segundo trimestre, a quantidade de aço vendido caiu 9,6% em comparação com o mesmo período de 2022, enquanto a receita tombou 20% na mesma referência.

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E as perspectivas ainda são turvas. O Fed sinalizou ao mercado que os juros por lá podem ficar acima de 5% até o fim de 2024 e ainda elevados em 2025. Significa crédito mais caro para investimentos, o que termina ceifando a demanda por aço. 

Nos EUA, a grande aposta da Gerdau está nos investimentos públicos dos pacotes bilionários de Joe Biden, anunciados em 2021. Foram US$ 1 trilhão para infraestrutura e US$ 500 bilhões dentro do programa de redução de inflação, que fomenta investimentos em energia renovável. É nessa segunda parte que a Gerdau mais se beneficia, já que a empresa é competitiva no fornecimento de infraestrutura para placas de energia solar.

Os desembolsos para esses projetos ainda não ganharam tração, o que abre espaço para uma melhora se esse cenário se confirmar.

“A gente percebe esses investimentos saindo do papel, mas a velocidade talvez seja menor que o esperado”, afirma Japur.

No Brasil, os juros já começaram a cair, e há sinais de uma retomada pelo setor de construção, com aumento da demanda por aço. A magnitude, porém, ainda é incerta. E há ainda a concorrência com a China.

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Imposto de importação de 25%

Em 2022, ainda sob Bolsonaro, o governo decidiu zerar tarifas de importação sobre produtos siderúrgicos, em um esforço de reduzir custos de matérias-primas e conter a inflação doméstica no ano de eleição.

No caso do vergalhão, o imposto de importação havia caído de 10,8% para 4%. Um ano e meio depois, a tarifa volta a ser aplicada integralmente agora em outubro, em meio à pressão das siderúrgicas brasileiras, que acusam a China de inundar o mercado local com o seu produto.

O gigante asiático é o maior produtor e consumidor de aço do mundo. Mas a desaceleração da economia chinesa e a brutal crise do setor de construção, iniciada pela incorporadora Evergrande, reduziu a demanda por aço  lá. O resultado foi um aumento das exportações do excedente.

Segundo dados oficiais do país asiático, a produção de aço cresceu 2,5% entre janeiro e agosto deste ano, para 712,93 milhões de toneladas. Já as exportações líquidas somaram  651,88 milhões, alta de 9%. E não há sinais de que o governo chinês controlará a produção – como fez durante a alta nos preços de energia do ano passado –, dado que a redução da atividade traria efeitos negativos sobre o PIB do país.

A Aço Brasil, associação das siderúrgicas no Brasil, diz que a China produz 200 milhões de toneladas além de sua demanda. Em 2016, quando também houve um aumento das exportações chinesas, o excesso de oferta era de 400 milhões.

Agora, a Gerdau puxa as discussões com o governo num esforço de subir o imposto de importação para 25% – a mesma alíquota adotada pelos Estados Unidos durante o governo Trump, e que foi alvo de acusações de protecionismo.

Analistas de ações têm dado pouca atenção à demanda da Gerdau em relação às tarifas, e enfatizam que a companhia está bem posicionada para atravessar períodos de incerteza. Mas passaram a reduzir o preço-alvo para o papel.

O BTG Pactual escreveu em relatório que o atual momento é desafiador para a indústria, ainda que seja otimista com o futuro. No curto prazo, a tendência é que os resultados encolham: o banco reduziu de R$ 39 para R$ 33 o preço-alvo da ação, mantendo a recomendação de compra. O potencial de alta é de 37%. O Itaú, que também recomenda ter GGBR4 no portfólio, diz que a ação terminará 2024 a R$ 30, abaixo dos R$ 31 que eram estimados para o fim de 2023.

É o mesmo patamar do Bank of America, que antes estimava preço-alvo de R$ 34. O banco americano manteve sua recomendação de compra para o papel enfatizando que a companhia tem boa diversificação geográfica, ativos de alta qualidade e não é exposta às variações do preço do minério, a principal matéria-prima para produção de aço.

Isso porque, além das duas holdings, a Gerdau tem outras características que a tornam uma empresa única. Uma delas é o fato de que ela produz 71% do aço a partir de sucata. 

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Pátio de sucata da Gerdau em Araçariguama (SP). 71% do aço produzido pela empresa é feito a partir de material reaproveitado. (Divulgação/VOCÊ S/A)

A outra é que a companhia tem ampliado a sua produção de minério em busca de autossuficiência para as usinas de Minas Gerais em uma janela de até quarenta anos. 

É um caminho diferente do seguido por outras siderúrgicas que investiram em mineração. A maioria delas apostou na estratégia de diversificação de negócios – como a CSN, que fez o spin-off desse braço listando a CSN Mineração na bolsa brasileira.

Com esse plano, para além de suprir suas fábricas, a empresa ainda pretende garantir que o minério seja mais puro, com pegada de carbono menor, e que será transportado por minerodutos, reduzindo gastos com combustível.

Trata-se de um projeto de longo prazo. Significa que ainda é cedo para medir os benefícios sobre resultados da companhia – e os dividendos. De qualquer maneira, o que a Gerdau mostrou é que está colocando em prática o seu slogan: o futuro se molda. 

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