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Bolsonaro quer “trabalhar” preço do combustível e crédito na Caixa

Ibovespa caiu 0,80% após um combo de intervenções políticas. Recordar é viver: ações repetem governo Dilma, apeado do poder há cinco anos.

Por Tássia Kastner
31 ago 2021, 17h50
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 (Tiago Araujo/VOCÊ S/A)
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De quantas intervenções se faz uma crise econômica? Só nesta terça, o presidente Jair Bolsonaro anunciou que pretende “trabalhar” os preços dos combustíveis, e Pedro Guimarães, à frente da Caixa, disse que o banco público prepara uma proposta bombástica e que mais de 100 milhões de pessoas terão linha de crédito diferenciada. Ele não deu detalhes.

Teve mais. O anúncio mirabolante de crédito foi logo seguido por uma notícia de Malu Gaspar, no Globo. Guimarães teria ameaçado banqueiros das instituições privadas durante as negociações da tal da carta da Febraban/Fiesp que pedia harmonia entre os poderes. Se assinassem tal documento, eles poderiam perder contratos com o governo federal.

Ainda mais. O governo entregou ainda a proposta de Orçamento para 2022 com um rombo de R$ 50 bilhões já na largada e, para arrematar, o ministro de Minas e Energia, general Bento Albuquerque, deve falar em rede nacional sobre o risco de apagão por causa da crise hídrica. Ele precisa comunicar o novo aumento na conta de luz e ainda o programa para incentivar a economia de energia – a saber, o desconto na conta será bancado com um aumento na tarifa de todo mundo, segundo o Estadão. Genial, não? 

Omitindo os nomes dos personagens, esse resumo de notícias – todas de hoje a gente jura – poderia muito bem pertencer ao período de 2013 a 2016. Quase que ironicamente, nesta terça-feira (31) faz cinco anos que o Senado confirmou o impeachment da presidente Dilma Rousseff. A justificativa legal, você sabe, eram as pedaladas (olá, parcelamento de precatórios!). Na prática, reclamava-se de inflação, interferência na Petrobras, aumento na conta de luz, políticas populistas com bancos públicos, irresponsabilidade fiscal e aparelhamento do governo. Tudo o que está no noticiário de hoje. 

Nesta terça, a bolsa brasileira caiu 0,80%, a 118.781 pontos. No mês, a baixa acumulada foi de  2,48% – totalmente na contramão do exterior, como falamos aqui ontem. Os juros futuros, que no limite medem o medo de investidores financiarem o governo, subiram. Já o dólar conseguiu descolar um tanto do cenário sombrio e fechou em queda seguindo o exterior. Cedeu 0,34%, a R$ 5,1719. Na mínima do dia, porém, foi a R$ 5,1167.

Ah, o dia de hoje teve duas notícias positivas: o desemprego caiu para 14,1% no trimestre encerrado em julho, ante 14,7% no período até abril, segundo o IBGE. 14,4 milhões de brasileiros continuam em busca de trabalho. O outro dado positivo é que a dívida pública brasileira caiu pelo quinto mês seguido e mais do que o mercado esperava: foi a 83,8% do PIB. A dívida total, em termos reais, continua subindo. A queda, portanto, é atribuída ao avanço um pouco maior do PIB – os números do segundo trimestre serão conhecidos amanhã às 9h.

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O ponto é que, mais uma vez, dois dados positivos não foram capazes de conter a queda da bolsa, e o governo foi novamente o responsável pelo dia vermelho na B3.

Petrobras

“A gente começa agora a trabalhar a questão do preço do combustível”, disse Bolsonaro nesta manhã a apoiadores que o esperavam na saída do Palácio do Alvorada. Segundo o presidente, agora dá para mexer na política de preços porque a dívida da companhia já foi reequilibrada. Será?

Lá por 2011, quando o barril de petróleo era negociado acima de US$ 100 no mercado internacional, a presidente Dilma Rousseff começou a barrar aumentos nos preços dos combustíveis para evitar o aumento da inflação. 

Parte dessa intervenção vem de uma ideia um pouco torta da tal autossuficiência de petróleo do Brasil. Sim, nós até tiramos do subsolo brasileiro mais óleo do que o necessário para produzir o combustível que a gente queima em carros e caminhões. Só tem um detalhe: uma parte desse produto é do tipo pesado, que engasga nas nossas refinarias. Não dá match. 

Aí, o que a Petrobras faz é exportar petróleo que não cola aqui (ok, bem mais do que o nosso refugo) e importar o produto que vai passar pelas refinarias. E vai pagar preço de mercado por ele. Foi nessa toada que a companhia começou a vender gasolina e diesel abaixo do preço de custo. Durou os quatro anos em que o brent (o tipo de petróleo referência no mercado internacional) ficou acima dos US$ 100. Ao fim de 2014, a companhia já estava em frangalhos – e endividada. O pico de quase R$ 500 bilhões em dívida foi atingido em 2015.

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E essa conta da gasolina subsidiada teve um peso ainda maior no caixa porque a companhia não parava de investir (e pagar propina nas obras), como depois ficamos sabendo pela Lava Jato. O lance é que o estrago de não aumentar o preço da gasolina, segundo especialistas, foi maior que o da corrupção.

A conta dessa disparidade? Lá por 2011, o dólar estava em R$ 1,70. Aquele barril de brent custaria uns R$ 170. Em 2014, quando o petróleo ainda estava acima de US$ 100, o dólar valia uns R$ 2,20. Resultado? Barril a R$ 200.  Hoje o combo petróleo x dólar sai por uns R$ 360, já que o óleo custa uns US$ 70, e o dólar, uns R$ 5,20.

A política de preços

Até Dilma ser apeada do poder, não havia uma política clara de reajuste de preços dos combustíveis, e o governo conseguia intervir diretamente na estatal, mesmo ela tendo ações na bolsa. Quando Temer assume o cargo máximo da república, nomeia Pedro Parente para controlar a companhia e colocar as contas em dia. 

É dali que vem a história de reajustar os preços dos combustíveis diariamente, seguindo o preço do barril lá fora e a cotação do dólar. No diesel, por sinal, isso durou só até maio 2018. Caminhoneiros pararam o país por causa do aumento no preço dos combustíveis e baixos valores de fretes. Ali a Petrobras deu uma flexibilizada na conta, congelou os reajustes e depois disse que adotaria uma política de amortecimento. Parente se demitiu no começo de junho daquele ano.

Já no governo Bolsonaro, em 2019, foram sucessivos ataques a essa política de reajustes, afinal combustível caro bate direto na popularidade do presidente. Até que, no começo deste ano, o presidente depôs o então mandatário da estatal, Roberto Castello Branco, e colocou no lugar o general Joaquim Silva e Luna. Nisso, a Petro perdeu mais de R$ 100 bilhões em valor de mercado em apenas dois pregões.

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Não dava para sair canetando no combustível sem fazer a ação tombar ainda mais. Silva e Luna, desde então, diz estar comprometido com o equilíbrio da companhia. Mas foi hoje que o chefe avisou que “agora dava” para mexer. “Mudamos o presidente há quatro ou cinco meses. Foi uma onda, a Petrobras perdeu R$ 20 bilhões, aquele papo de interferência. Mesma coisa que um prefeito assumir e não poder trocar o secretário”, foi outra declaração de Bolsonaro nesta manhã. R$ 20 bilhões foi a queda em um só dia – R$ 28 bi, na verdade. E Castello Branco era uma indicação de Paulo Guedes lá no começo do governo, sempre bom lembrar.

No resultado de hoje, as ações preferenciais da estatal (PETR4) caíram 3,60%, e as ordinárias (PETR3) recuaram 2,30%. Bem mais que o petróleo, que cedeu 0,57%.

Crédito

Não dá para saber o que Pedro Guimarães quis dizer com um programa de crédito para 100 milhões de brasileiros, a ser anunciado em duas ou três semanas. O que se sabe é que o endividamento das famílias supera os 60%, um recorde da série histórica do Banco Central. E que o desemprego elevado e o aumento das taxas de juros têm o potencial de elevar a inadimplência.

Foi em 2012 que o governo Dilma Rousseff usou bancos públicos para tentar reduzir a pauladas as taxas de juros cobradas pelos bancos. Virou tudo inflação, por excesso de consumo, inadimplência e um tombo na rentabilidade de Caixa e Banco do Brasil. Os dois precisaram ser capitalizados pelo governo para não quebrar.

Ainda que Pedro Guimarães tenha sido mais vocal, o Banco do Brasil também esteve envolvido na polêmica de ontem do governo, a da Febraban. Hoje, porém as ações subiram na esteira do bom desempenho dos pares privados. 

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As contas públicas

Em 31 de agosto de 2015, Dilma Rousseff enviou ao Congresso uma proposta de orçamento para 2016 com déficit. Foi um escândalo e os mercados reagiram de forma histriônica.Eram R$ 30 bilhões de rombo. Hoje, 31 de agosto de 2021, a equipe de Guedes mandou o orçamento com estimativas econômicas (como inflação) defasadas, os precatórios impagáveis, sem o aumento do Bolsa Família prometido pelo governo e, ainda assim, há um rombo de R$ 50 bilhões.

O Ibovespa aprofundou a queda, e os juros subiram depois do anúncio, pelas 15h. No dia seguinte, a manchete da Folha de S.Paulo estampava um selo chamado “Brasil em Crise”. O dólar, naquele agosto hoje distante, acumulou alta de 6%; a bolsa brasileira recuou 8,33% (a 46.625 pontos).

Existe, sim, uma grande diferença em relação a 2015. No dia 31 de agosto de 2015, ninguém estava com medo dos resultados de uma manifestação de 7 de Setembro promovida pelo governo. Não é o caso das ameaças golpistas de 2021.

MAIORES ALTAS

Braskem (BRKM5)  5,09%

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Hypera (HYPE3)  2,82%

Copel (CPLE6) 1,98%

B3 (B3SA3)  1,97%

MRV (MRVE3) 1,93%

MAIORES QUEDAS

CSN (CSNA3) -4,99%

Banco Inter (BIDI11)  -3,99%

Americanas sa (AMER3)  -3,96%

Lojas Americanas (LAME4)  -3,76%

Magazine Luiza (MGLU3) -3,39%

Ibovespa: queda de 0,80%, a 118.781 pontos

Nova York

Dow Jones: -0,12%, a 35.359,08 pontos

S&P 500: -0,14%, a 4.522,57 pontos

Nasdaq: -0,04%, a 15.259,24 pontos

Dólar: queda de 0,34%, a R$ 5,1719

Petróleo

WTI: queda de 1%, a US$ 68,52

Brent: queda de 0,57%, a US$ 72,99

Minério de ferro

queda de 1,91%, a US$ 153,67 a tonelada no porto de Qingdao.

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