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Como a Track & Field dribla a alta da inflação e continua sua maratona de crescimento

O CEO Fred Wagner explica nesta entrevista como os planos conservadores da época do IPO, em outubro de 2020, viraram um trunfo para a companhia.

Por Tássia Kastner
Atualizado em 19 jul 2022, 10h10 - Publicado em 8 jul 2022, 05h53
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 (Eduardo Frazão/VOCÊ S/A)
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Correr uma maratona exige planejamento de longo prazo e progressão passo a passo. Essa era a ideia da Track & Field (TFCO4), rede de moda esportiva, quando fez seu IPO em outubro de 2020. Numa oferta de ações, é comum que as empresas vendam planos ambiciosos para atrair investidores. A companhia fez o contrário: manteve os pés no chão. O mercado considerou essa estratégia conservadora demais, e a empresa acabou vendendo suas ações a um preço menor do que esperava. 

O CEO da Track & Field, Fred Wagner, diz que essa posição se mostra acertada agora, pois está ajudando a empresa a atravessar a turbulência do mercado financeiro. Ela segue crescendo, mesmo com o cenário adverso.  

E o fato é que, apesar do foco na maratona, a Track & Field entrega resultados de 100 metros rasos: o lucro da empresa triplicou no primeiro trimestre, na comparação com o mesmo período de 2021. 

Nesta entrevista, o executivo detalha as razões para a expansão do negócio, e como a companhia gerencia a alta da inflação, que vem corroendo os resultados de boa parte da concorrência.

A Track & Field tem atravessado o agravamento da crise econômica no país com crescimento nas vendas. Quais são as razões para isso? 

A crise é uma coisa maior, e a empresa já viveu algumas. Viemos de um ambiente de juros baixos, capital muito barato. Todo mundo se acostumou, tanto na parte pessoal quanto na empresarial. Depois veio o ciclo da pandemia, que foi muito triste, mas mudou o comportamento das pessoas, como elas trabalham, se relacionam. E quando se fala de Track & Field, nosso mercado endereçável aumentou. Nossa missão é conectar as pessoas a um estilo de vida saudável, e elas começaram a se preocupar mais com isso. Ao mesmo tempo, a gente foi ágil para perceber as mudanças na forma como o consumidor se relaciona com marcas.

Vocês atribuem os bons resultados ao que chamam de social selling. O que é isso?

Social selling é a gente se conectar diretamente com o consumidor para uma venda por algum canal alternativo ao tradicional [loja física]. Acontece muito por WhatsApp. O cliente compra por ali e a gente manda o link de pagamento. Estamos ampliando as formas de fazer esse contato com o consumidor.

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Pode ser a abordagem do cliente pelo WhatsApp, mas podem ser outros canais, como a pessoa que entra no e-commerce e decide conversar com um vendedor. 

A experiência é diferente de um e-commerce tradicional, em que você tem que selecionar os produtos e fazer o check-out.

A conversão de vendas é maior por esse sistema?

Tradicionalmente, falava-se de venda de varejo e de e-commerce. A gente fala de “venda presencial” e “venda influenciada digitalmente”. Essa venda digital engloba tudo – e-commerce, pessoas que entram no social selling, alguém impactado por e-mail marketing. Isso equivale a mais de 30% [do faturamento].

E daqui para frente: como a alta de juros e a perda de renda da população vai afetar a companhia?

Falando de cenário macroeconômico, é um ano de juros mais altos e também um ano eleitoral, mais turbulento. O consumidor vai sentir – principalmente em produtos relacionados a financiamento, importação e viagens para o exterior. Linha branca, automóvel e imóvel devem sentir bastante também. Toda empresa tem uma linha de custo financeiro e uma de custo de frete. A gente está vendo esse aumento de preços reduzir a capacidade de compra do consumidor. 

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Do ponto de vista micro [da empresa], a gente já passou por várias situações parecidas com essa no passado, e tentamos administrar o preço de venda para minimizar o impacto ao consumidor final. Em momentos de crise, nosso mercado sofre relativamente menos. Se a pessoa está estressada, quer correr, fazer esporte, meditar. Mesmo com o cenário hoje, a gente continua vendo um mercado performando bem.

Outra vantagem: a empresa não tem dívida. O fluxo de caixa é positivo, então não temos aumento de custo financeiro com a alta da taxa de juros. Empresas mais endividadas têm uma mudança significativa de DRE [demonstração de resultados]. Sempre fomos muito conservadores, e é engraçado que sempre conversamos com várias pessoas que diziam “olha, seu capital está mal empregado; você deveria distribuir lucro, alavancar a companhia”. E a resposta sempre foi “a gente vive no Brasil, é preciso ser conservador”. E o momento está mostrando isso. 

Nossa visão é essa. Estamos bem abastecidos, com custo de insumos controlados e vendo consumo acontecer de forma saudável. Quando olhamos a floresta, vemos outros setores e outras operações sofrerem um pouco mais.

Isso significa que, mesmo com a alta de custos e da inflação, vocês não esperam redução de margens? 

Não estamos esperando redução de margem no nosso negócio, pelo contrário. Estamos conseguindo melhorar um pouco as margens e entregar mais rentabilidade para a companhia.

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Mas o setor de varejo de moda está sofrendo como um todo nesse cenário e só vocês escapam. Isso significa o quê? Vocês acharam a fórmula mágica?  

Não. Eu acho que outros varejistas muito competentes também acharam a fórmula mágica. Talvez de outra maneira, em que o mercado endereçável não cresceu tanto, mas neste momento conseguiram fazer fusões e aquisições muito boas. Trouxeram crescimento através de concentração. A gente olha a estratégia do Grupo Soma e da Arezzo. Eles estão indo muito bem.  

As aquisições tendem a crescer quando a bolsa fecha para novas ofertas. Vocês pretendem crescer por aquisições também?

Não está no nosso radar e não vemos necessidade de fazer aquisições para entregar o crescimento que estamos projetando. Obviamente estamos sempre abertos, mas tentamos gastar pouco tempo olhando. Em relação ao mercado, a gente acha que vai acelerar.

O IPO da Track & Field saiu abaixo do que vocês esperavam. Por outro lado, as ações conseguiram se sustentar em alta por um bom período depois da operação, enquanto outras varejistas afundavam. A que você atribui isso?

Tem um contexto. Investidores que entraram na oferta entenderam muito bem a nossa tese, a visão de longo prazo, o histórico e os executivos que nós temos. E acho que investiram com essa cabeça de longo prazo, o que reflete na baixa liquidez que o papel tem [R$ 300 mil por dia em negociações]. Não foram investidores que entraram em Track & Field para fazer um lucro rápido. Não quer dizer que, ao longo do mercado atual, não existam investidores que precisem vender o papel – e não tem nada a ver com a empresa. É um contexto de mercado de capitais, com o dinheiro migrando de ações para renda fixa. Pode ser visto como uma oportunidade, ou não, dependendo de como o investidor olha. 

Isso é diferente de um negócio que prometeu entregar muito no IPO. Uma coisa que estava muito clara quando decidimos fazer a oferta era sermos conservadores no que prometemos entregar. E sempre entregar a mais, porque a maior parte do nosso capital continua na companhia. A oferta foi uma venda de participação minoritária, para dar a possibilidade de investidores se tornarem nossos sócios.

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As empresas que fizeram o contrário tiveram uma valorização maior no início, mas na hora em que a realidade bate à porta, que é o que está acontecendo agora, elas acabam não conseguindo entregar as projeções e sofrem mais. Principalmente as techs.

Uma das críticas à Track & Field foi que vocês decidiram não fazer IPO pelas regras do novo mercado, mas mantendo ações num esquema parecido com o americano, de “supervoto”. Por que vocês foram por esse caminho?

Pode ser uma crítica ou um upside – depende do controlador e da confiança que se tem nele. Em empresas com track record e controlador com proposta de valor clara, isso é uma proteção para o investidor. A gente vê companhias que tinham controladores muito bons, mas que na hora em que mudou a administração, geralmente para gestores com uma visão mais financeira, perderam muito valor. Em geral, quando entra uma visão mais financeira, você quer pegar todas as oportunidades, independentemente do reflexo que isso tem na construção de marca ao longo do tempo. Em moda, porém, não se pode perder a cabeça de construção de marca. 

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