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É hora de comprar ações da Americanas (AMER3)?

A empresa resistiu em unir Lojas Americanas à B2W. Ficou para trás e agora tenta abrir novas frentes para recuperar eficiência. E chamou Sergio Rial para tocar a nova fase. Chegou a vez de investir na Americanas?

Por Tássia Kastner
Atualizado em 12 jan 2023, 12h20 - Publicado em 14 out 2022, 06h51
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 (Americanas/Divulgação)
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“Chama o Meirelles.” O que era para ser só um slogan da campanha de Henrique Meirelles à presidência em 2018 virou um bordão da Faria Lima. Chamar o Meirelles, que foi presidente do Banco Central no governo Lula e ministro da Fazenda sob Temer, é sinônimo de pedir socorro quando há uma crise de confiança com o governo.

O mundo das empresas da B3 também tem o seu “Meirelles”, um CEO que tem sido convocado para momentos complexos. Trata-se de Sergio Rial. Entre 2013 e 2015 ele capitaneou a saída do frigorífico Marfrig de um atoleiro de dívidas. Em 2016, migrou para o Santander e transformou-o no banco mais rentável do Brasil – um feito ainda mais impressionante quando comparado com o histórico de outros bancos estrangeiros por aqui. O HSBC deixou o país e o Citi desistiu de atender clientes pessoa física no Brasil. O banco espanhol, pelo contrário, fincou raízes. Missão cumprida, Rial entregou o posto de CEO da instituição em janeiro.

A Americanas, então, chamou o Rial. Em 2023, o ex-banqueiro sucederá Miguel Gutierrez, que ficou no comando da empresa por mais de duas décadas. No dia do anúncio, em agosto, as ações AMER3 saltaram 20%.

A alta foi fogo de palha, e as cotações praticamente voltaram ao patamar original. O Credit Suisse resumiu o sentimento dos investidores. “Rial tem um histórico comprovado em diferentes indústrias. Permanece o desafio de entregar um forte crescimento, especialmente no segmento online, onde a empresa teve um desempenho inferior ao de seus pares nos últimos anos.”

A Americanas enfrenta um desafio duplo. Recuperar terreno no e-commerce enquanto o varejo como um todo padece do combo de juros altos e perda de renda da população. Não é à toa que as ações da varejista acumulam queda de 87% desde o pico atingido em agosto de 2020. As concorrentes Magazine Luiza e Via (dona das Casas Bahia e Ponto) sofrem tombos igualmente estrondosos: -83% para MGLU3, -85% para a VIIA3. O Mercado Livre, líder de e-commerce no Brasil, mas negociado em Nova York, cai “apenas” 56% desde o pico recente.

Se todas as empresas do ramo estão péssimas na bolsa, por que só a Americanas precisou chamar um Meirelles? Para entender isso, primeiro é preciso olhar para o passado.

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Sobrevivente

As Americanas têm uma história quase centenária, algo raro para as varejistas do país. Basta lembrar das falidas Mesbla, Lojas Brasileiras ou Arapuã – o Ponto surgiu como Ponto Frio em 1946 e a Casas Bahia seria fundada em 1952, 23 anos depois das Lojas Americanas. A companhia nasceu em 1929, no Rio de Janeiro. Tinha como público-alvo servidores, gente com renda estável, mas relativamente baixa. Até hoje o foco das lojas físicas da Americanas é esse.

O IPO veio nos anos 1940. Quatro décadas e uma hiperinflação depois, a empresa estava em apuros. Foi nos anos 1980 que Jorge Paulo Lemann e seus sócios se tornaram os controladores da empresa. 

Lemann, ao lado de Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira são os investidores por trás do 3G Capital, um private equity conhecido pela capacidade de transformar negócios. O mais simbólico é o da Ambev. Mas a Americanas não ficou atrás: a companhia se reergueu daquela crise dos anos 1980 e conseguiu colocar no ar, em 1999, um dos primeiros e-commerces do Brasil, a Americanas.com.

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(Americanas/Divulgação)

Só tem um detalhe: apesar de carregar o nome da empresa-mãe, desde o começo a loja online era um negócio completamente apartado da operação física. A Americanas.com era uma subsidiária da Lojas Americanas. Fazia sentido. Àquela altura o e-commerce era um embrião e estava longe de ser algo rentável. Desse jeito, os eventuais prejuízos da fase inicial não contaminariam o negócio principal.

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Em 2006, a Americanas comprou o Submarino, criado também na virada do milênio, e fundou assim a B2W. Por anos a fio, a empresa foi líder no comércio online enquanto antecipava a importância que o segmento teria no futuro. Naquele ano, 13 milhões de brasileiros tinham acesso à internet em casa – hoje a internet chega a 90% dos lares, segundo o IBGE.

Curiosamente, a jovem operação da B2W dava lucro. Assim foi em 2006, 2007, 2008. Em 2009, os números começaram a piorar. De 2011 em diante, a B2W emendou uma década de prejuízos. Por mais que as receitas continuassem crescendo, não era o bastante para fazer frente à expansão da concorrência e a despesas com dívidas que ultrapassavam R$ 1 bilhão por ano. 

A comparação era ainda pior ante o sucesso que a Magazine Luiza passou a fazer junto aos investidores. E o que garantia o apoio do mercado financeiro ao projeto Magalu era justamente a aposta na integração entre as lojas físicas e o e-commerce – a ideia de que tudo precisaria ser uma coisa só. A Americanas seguia na contramão dessa tendência: Lojas Americanas era um negócio (que dava lucro), B2W era outro (com prejuízo). Isso só começou a mudar em 2021. 

Manobras

Em fevereiro de 2021, pela primeira vez as companhias comunicaram ao mercado financeiro que estudariam uma fusão. Quando o primeiro projeto veio, tratava-se de um contorcionismo complexo e pouco eficiente, cujo único objetivo era manter Lemann, Telles e Sicupira no controle da companhia. 

O lance é que, até então, existiam as ações LAME3 e LAME4, para Lojas Americanas, e BTOW3 para a B2W. A proposta apresentada em abril transformava a Lojas Americanas numa holding, uma empresa cuja função de existir era apenas ter o controle de uma nova companhia, a americanas s.a. (assim, sem letras maiúsculas mesmo). Essa nova empresa juntaria a parte operacional das Lojas Americanas com a B2W. Na prática, o mercado financeiro continuaria lidando com LAME3, LAME4 e uma terceira ação, a AMER3 (no lugar da BTOW3). Ou seja: os custos de manter duas empresas – dois departamentos financeiros, dois RHs, dois jurídicos etc. continuavam ali. Pegou mal.

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Para investidores, os donos da Americanas queriam mudar para continuar fazendo a mesma coisa. E, para isso, mantinham uma estrutura acionária complexa.

A empresa só cedeu em novembro, quando decidiu extinguir a LAME e converter todas as ações em AMER3. Finalmente a americanas s.a. seria uma empresa simplificada. Os donos da companhia ficaram com 29,5% das ações. Deixaram de ser controladores e se tornaram o que o mercado chama de acionista de referência, capaz de ditar os rumos da companhia, mas precisando dos votos dos minoritários em assembleia para aprovar mudanças. Ela criou também sua poison pill, mecanismo que impede um único investidor de comprar mais de 30% das ações e ganhar mais poder de decisão que Lemann e sua trupe. Só que a mudança não gerou um novo rumo para as ações. 

Queda livre

Quando a reorganização saiu, os papéis da Americanas já eram negociados ao redor de R$ 26, R$ 100 a menos que o pico de R$ 126 batido em agosto de 2020 – essa época de alta, lembre-se, era o auge da pandemia, quando o mercado financeiro pregava um futuro brilhante para as ações ligadas ao e-commerce. 

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(Arte/VOCÊ S/A)

Só que, dali, os papéis começaram a cair – a Magalu e a Via só experimentaram o tombo de verdade em 2021. No fim, o que se deu com a Americanas serviu como um alarme do que ocorreria com as ações das varejistas ao longo de 2021.

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Foi em março do ano passado que o Banco Central começou a içar as taxas de juros brasileiras, do vale de 2% ao cume de 13,75%. Era uma medida de combate à inflação, que disparava até alcançar seu pico mais recente, os 12,13% nos 12 meses encerrados em abril deste ano. Para coroar, a renda dos brasileiros diminuiu. Quem mal consegue abastecer a geladeira não vai pensar em trocá-la. Isso depois de um ano inteiro em que o tempo gasto em casa durante a pandemia havia estimulado uma renovação nos eletros e móveis. A ressaca bateu.

Os dados do segundo trimestre de 2022 mostram que a companhia continua crescendo com força nas vendas em lojas físicas (+27%), mas a receita do varejo online caiu 7,6%. E isso é preocupante porque mais da metade dos R$  7,96 bilhões de receita bruta da companhia vem das vendas online, não das lojas de concreto armado.

E o cenário daqui para frente segue turvo. A inflação dá sinais de arrefecimento no país, mas os juros têm tudo para continuar altos 2023 adentro, de acordo com o próprio BC. Junte a isso uma desaceleração econômica prevista para o ano que vem, combo causado pela manutenção da curva de juros num patamar alto e pela recessão global que se arma. Fica difícil esperar uma expansão acelerada nas vendas e aumento no faturamento.

Esse é o motivo para uma parte dos analistas ter uma recomendação neutra para o papel – não comprar nem vender. O Goldman Sachs estima que a ação poderá subir dos R$ 16,98 do fechamento de setembro para R$ 19. A XP fala em R$ 20, o que daria uma alta de 18%.

O BTG Pactual é mais otimista: recomenda a compra, com alvo de R$ 29 ao fim de 2023.

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Já o Itaú colocou suas projeções em revisão porque as estimativas anteriores não estavam avaliando corretamente todas as mudanças sofridas pela AMER ao longo do último ano. Vamos a elas.

Futuro em 24 horas

Enquanto não resolvia completamente como seria sua unificação em uma única empresa, a Americanas não estava parada. Um dos dilemas do e-commerce hoje é como fidelizar o cliente no seu site. E um dos caminhos que as varejistas seguiram é ter o maior sortimento de produtos possível. Talvez você compre uma TV a cada cinco anos e um celular a cada dois ou três.

Já comida, você comprará sempre. 

Para entrar no mundo dos produtos de compra recorrente, a companhia arrematou a rede de hortifruti Natural da Terra por R$ 2,1 bilhões. Também de olho no consumo mais efêmero, adquiriu 70% do grupo Uni.Co, dono das marcas Puket (de roupas, mochilas e cia) e Imaginarium (de acessórios), numa transação estimada em R$ 250 milhões pela XP. 

A Americanas também financeirizou-se mais com o AME, a conta de pagamento usada para dar cashback e descontos nas lojas da companhia. E investiu em outro nicho, uma parceria com a Vibra (ex-BR distribuidora) para operar a rede de lojas de conveniência, agora sob o nome VEM.

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Por fim, o fruto mais palpável da fusão das Lojas Americanas com a B2W já está em funcionamento. A Americanas finalmente passaria a usar suas lojas para entregar compras feitas pelo site – um jeito de otimizar estoques e baratear a logística, como todos os concorrentes já fazem. 

Dá para dizer que Sergio Rial chega à Americanas com uma empresa já em transformação. Agora que as ferramentas estão postas, é preciso torná-las mais rentáveis. Se der certo, há potencial de recuperação para os papéis, que são negociados em patamares não vistos desde 2017.

O curioso aqui é que a Americanas, de alguma maneira, já sabia que esse era o caminho e talvez não precisasse ter sofrido tanto para segui-lo. Quem ensinou foi o Submarino. E foi em 2002, quatro anos antes de se unir à Americanas. O e-commerce foi retratado em uma reportagem do The New York Times como “a Amazon brasileira”. Naquele artigo, o Submarino explicava que a estratégia para competir com as lojas físicas era ter um serviço de alta qualidade, imediatamente traduzido como entrega em menos de 24h no estado de São Paulo e em dois dias nos estados próximos. Muita coisa mudou na internet (e no Brasil) nessas duas décadas. A vontade de comprar online e receber rápido continua a mesma. Para ter lucro, é preciso atendê-la.

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