Ibovespa tem dia de avestruz, ignora caos em Brasília e sobe quase 1%
Alta teve um empurrão da Petrobras, mas o impressionante mesmo foi a disparada das ações do Pão de Açúcar.
Tudo indica que o Ibovespa decidiu ter um dia de avestruz: enfiou a cabeça em um buraco para não ver os problemas do país. Ignorando o dia fraco lá fora e o caos político em Brasília, a bolsa brasileira subiu quase 1% nesta segunda-feira (12).
O presidente Jair Bolsonaro anda às voltas na tentativa de barrar a CPI da Covid no Senado, até que a articulação virou uma bagunça. O senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) divulgou uma conversa com o presidente sobre o tema. O que Brasília entendeu do diálogo é que Bolsonaro fez pressão para que o senador peça o impeachment de ministros do Supremo e que modifique o texto base da CPI para que ela inclua investigações contra governadores e prefeitos na gestão da pandemia. Na visão do presidente, o inquérito atual teria como objetivo único prejudicar seu mandato.
Bolsonaro também adotou tom ainda mais belicoso contra o Congresso e insinuou que teria que “sair na porrada” com o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), autor do requerimento da instalação da CPI. As colocações, é claro, não foram bem recebidas pelos congressistas, que viram nas palavras do presidente uma tentativa de interferir nos outros poderes.
Eis uma relação inversamente proporcional: de perda de poder de Bolsonaro e fortalecimento do Senado. E o timing é péssimo. Isso porque o presidente já anda com um problema gigantesco com a Câmara. Aí voltamos à novela do Orçamento.
O texto aprovado pelo Congresso é considerado inexequível e levaria a uma nova rodada de pedaladas fiscais — aquelas que serviram de justificativa jurídica para o impeachment da presidente Dilma Rousseff. O Ministério da Economia recomendou o veto à proposta, deputados e senadores recorreram ao “deixa disso”. Em palavras mais técnicas, disseram que matariam no peito a falta de dinheiro para despesas obrigatórias, desde que o ajuste seja feito ao longo do ano. O deixa disso foi tão longe que já há uma articulação para que Bolsonaro e Mourão viajem, assim o presidente da Câmara, Arthur Lira, sancionaria o texto e ficaria com o ônus de um Orçamento que não para de pé.
A situação já não era favorável para Bolsonaro antes, com a CPI e todo o enrosco posterior. E faz semanas que o mercado financeiro cobra uma solução que preserve o teto de gastos e evite o aumento da dívida pública.
O problema é que a pandemia continua acelerando no país. E do jeito que o orçamento está, não haverá dinheiro para bancar o aumento inevitável de gastos com saúde e nem as medidas econômicas para amenizar a crise causada pelo coronavírus — as principais são os programas de redução de salário e jornada e o crédito a empresas.
Uma saída em estudo para fazer a conta fechar foi revelada pela Agência Estado nesta tarde: o ministro Paulo Guedes quer propor uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que coloque os gastos extras da saúde fora do teto de gastos. Esse seria um jeito de bancar as novas despesas, sem o decreto de calamidade pública (que abriria porteira para gastos de maneira indiscriminada).
A Faria Lima não gostou muito da ideia, mas não deu para notar pelo Ibovespa. O índice fechou em alta de 0,97%, a 118.811 pontos, na máxima do dia. Só o volume de negócios que continua reduzido em relação à média do ano: o pregão movimentou R$ 24 bilhões, ante média diária de R$ 36 bilhões no ano
Os sintomas de que a medida pode ser um problema para as contas públicas apareceram no dólar (que chegou a subir mais de 1% no pior momento do dia e voltou a ficar acima de R$ 5,70) e nos juros futuros (que desaceleraram o ritmo de queda após a notícia). Quando investidores temem o equilíbrio fiscal, cobram mais para emprestar ao governo.
O efeito-avestruz teve um empurrão da Petrobras. A estatal subiu 0,97% no dia em que acionistas votaram em assembleia o nome de Joaquim Silva e Luna para a presidência da companhia. Ele assumirá o posto de Roberto Castello Branco, que foi demitido por Bolsonaro em fevereiro em mais um episódio de intervenção na estatal.
Mas a estrela mesmo foi o Pão de Açúcar, que caiu nas graças dos investidores depois que o plano de reestruturação do negócio avançou. Nesta segunda, a alta foi de impressionantes 9,79%, para R$ 37. Desde a cisão com o Assaí, no começo de março, a companhia disparou 236% – a história você relembra aqui.
Foi um dia tão atípico, que a bolsa conseguiu se descolar completamente do exterior. Em Nova York, o índice S&P 500 chegou a bater um recorde intraday, mas fechou praticamente estável (-0,02%) após atingir seu recorde histórico na última sexta. Resta saber quanto tempo o mercado financeiro vai aguentar com a cabeça no buraco.
Maiores altas
Pão de Açúcar: 9,79%
Braskem: 7,82%
Minerva: 5,18%
Eneva: 4,63%
JBS: 2,87%
Maiores baixas
Eletrobras PNB: -2,84%
Azul: -2,54%
Eletrobras ON: -2,00%
Eztec: -1,46%
BR Malls: -1,31%
Ibovespa: +0,97%, a 118.811 pontos
Bolsas americanas
Dow Jones: -0,16% (33.746 pontos)
S&P 500: -0,02% (4.128 pontos)
Nasdaq: -0,36% (13.850 pontos)
+0,84%, a R$ 5,7224
Petróleo
Brent: +0,40%, a US$ 63,35
WTI: +0,43%, a US$ 59,75
Minério de Ferro,
+0,59%, para US$ 174,57 a tonelada no porto de Qingdao, na China